1.11.2006

Eu me arrependo...

Se arrependimento matasse, há muito tempo já estaria no mundo das almas penadas, pois me arrependo de tudo, ou quase tudo, que fiz e deixei de fazer. Hoje, chego à melancólica conclusão de que nesses primeiros 25 anos de vida, contruí para meu futuro um alicerce que não aguentaria nem um casebre de dois cômodos, e que nada fiz de legal e bom, nem para mim e nem para os outros. Não estou dizendo que minha vida seja uma infeliz injustiça, ou muito menos um triste calvário. Não, nada disso. A vida me é muito boa e me deu grandes oportunidades. Estou falando de decisões que tomei, de coisas que deixei para trás, de pessoas que não dei o valor merecido, de objetos que deixei de comprar, de amigos que não percebi...

Me arrependo de, quando criança, não ter aproveitado mais meus brinquedos, não ter montado mais meu ferrorama, apenas para ver o trenzinho andar.

Me arrependo de ter abandonado minhas aulas de natação e musculação. Se tivesse prosseguido, hoje não seria esse gordo sedentário, e sim um cara sarado, praticante de esportes e talvez, muito cobiçado pelas mulheres.

Me arrependo de, na hora H para a inscrição do vestibular, ter mudado de opinião e escolhido matemática e não jornalismo, como era o meu plano inicial. Talvez, eu não teria abandonado o curso no terceiro semestre, por achar difícil demais, caro demais e sem futuro nenhum...

Me arrependo por ter sido sempre tão apaixonado, sempre tão romantico, tão carinhoso, por ter dado flores, escrever cartas, por se declarar. De nada adiantou. Me arrependo de ter me apaixonado pelas mulheres que me apaixonei. Elas não mereciam.

Me arrependo de ter pedido para sair do Circo do Marcos Frota e seguir em busca de um novo desafio, que seria gerenciar meu próprio circo. Eu estava no topo da minha carreira profissional e no auge da minha satisfação pessoal. Tinha o emprego que pedi à Deus, estava realizando o meu único sonho de vida, ganhava um gordo salário, tinha duas concessões de vendas dentro do circo, me relacionava muito bem com os colegas artistas e com a gerência, fiz amizades com atores da Rede Globo de televisão, estava sob os holofotes e tinha a admiração das mulheres, era cobiçado e desejado por elas (só porque era o mágico do Marcos Frota e o locutor que entrevistava os atores da TV, mas tudo bem, pelo menos era desejado), estava viajando pelo Brasil inteiro, conhecendo cidades, pessoas, culturas e praias, além de ter adquirido em tão pouco tempo um trailer Karmann Guia 740 (um dos maiores e mais luxuosos fabricados por esta empresa) e novos aparelhos de magia (aperfeiçoando, assim, meu trabalho). Para completar esse kit de felicidade, ainda havia perdido 15 quilos e estava esbelto... Ou melhor, quase esbelto.

Sem uma razão óbvia, eu renunciei à tudo isso. Por que eu abri mão da minha felicidade? Passo as noites em busca dessa resposta, tentando achar o que me fez querer sair do circo. O que me passou pela cabeça? O que me fez achar que eu poderia ser ainda mais feliz? Por que eu não fiquei quieto ali no circo, fazendo a minha magia e apresentando o espetáculo? Não sei. Não sei...

A verdade, a única verdade é que eu joguei fora a única oportunidade da minha vida. Mais do que isso, joguei fora a minha felicidade, o meu plano de existência. Tudo o que eu queria era ter uma família, morando no circo. E o circo de Marcos Frota era o lugar certo para isso. Ter saído de lá é o meu mais devastador arrependimento.

Ah, mas continuando a história, depois que eu cometi esse assassinato contra a minha felicidade, eu montei o meu circo sim, em sociedade com o gerente do circo do Marcos Frota. E esse foi o meu mais recente arrependimento. Foram nove meses de trabalho até a estréia do circo. Um investimento de quase 25 mil reais para que o material (lona, ferragens, carretas) fossem todos pintados e arrumados. Contratei os melhores artistas, que vieram de grandes circos, todos, confiando no meu potencial. O meu circo foi um fracasso. Fechei as portas, ou melhor, as cortinas. Junto com elas, se fecharam minhas possibilidades. Acarretei uma dívida de 36 mil reais, cuja maior parte ainda preciso pagar. Fiquei sem credibilidade, perdi o luxuoso trailer que havia comprado, caí no abismo. É isso mesmo, não foi nem poço, foi abismo!

Hoje, daria tudo para que o tempo voltasse. Mas, infelizmente, ele não volta.

Um comentário:

Fernanda Souza disse...

Será que não é um bom momento para recomeçar e retomar antigos planos?

Acho que tu viveu um dos teus sonhos: o circo. Agora pode viver outros... estudo, trabalho... voltar para a natação ;)